De um lado, numa pequena mesa com apenas uma cadeira, sentava-se um homem bem parecido de meia idade, com as pernas cruzadas, a ler um livro, segurando, com a mão livre, um cigarro.
Do outro lado da esplanada, uma senhora elegante, igualmente numa mesa pequena, sozinha a ler uma revista, também com as pernas cruzadas. Havia ali uma certa simetria: cada um no seu canto, a fazer a mesma coisa, com um modo de estar bastante parecido, o fumo do cigarro a ir-lhes para a cara e os óculos escuros a esconder-lhes os olhares.
Entre os dois estavam dois grandes grupos de amigos, felizes e faladores, a desfrutar de uma cerveja fresca apesar do frio.
Um dos grupos levantou-se. Ficou um vazio. Os dois permaneciam afastados por um grupo. Mas com a retirada de um dos “obstáculos” foi notório que os dois se entre olharam, rapidamente voltando a colocar o olhar naquilo que estavam a ler.
A senhora descruzou as pernas, e voltou a cruzá-las.
Entardecia e o sol começava a pôr-se.
O outro grupo começou a desmoronar-se: os amigos despediam-se com grandes abraços, beijos e acenos. O espaço entre os dois rapidamente se desintegrava.
O momento tão esperado aproximava-se. A tensão aumentava. Quem iria dar o primeiro passo? Ela? Ele? Nenhum?
Os últimos dois amigos levantaram-se, abraçaram-se e desimpediram o caminho.
Ainda nem uma palavra tinha sido enunciada e um dos dois já corava.
Ela tirou os óculos de sol. Descruzou as pernas e olhou para aquele homem.
Ele acabou a sua cerveja e virou-se para ela. O seu olhar cinzento azulado deixou-o imóvel. Não tinha outra hipótese a não ser deixar-se mergulhar neles. Não era a primeira vez que ele a via ali, e sempre a tinha achado linda, aliás, ele continuava sem perceber como era possível ela nunca ter companhia.
Ela lambeu os lábios.
O coração dele começou a galopar. Parecia que estava prestes a correr os 100 metros e que o tiro da partida estava prestes a ecoar.
—Parece que, mais uma vez, ficamos só os dois, não é? - deu uma risadinha adorável, continuando a olhar para ele.
Ele era incapaz de emitir qualquer som. Sentiu-se ridículo. A mente dele era um vácuo. As bochechas flamejavam. «Que ridículo, nem as cinco cervejas que bebi fizeram efeito» pensava ele.
Começou a gaguejar, conseguindo, por fim, dizer:
—Sim... parece que as pessoas se vão embora quando o ambiente é melhor – apontando com a cabeça para o pôr de sol.
Ela anuiu. Ainda não tinha desviado o olhar e tinha agora um leve sorriso nos lábios, quase imperceptível, o que contribuía para o seu ar misterioso.
—Costuma estar aqui, não é? Acho que já o vi aqui bastantes vezes.
Já ganhando alguma confiança:
—Sim, gosto de vir para aqui, especialmente ao fim da tarde. É ideal para ler.
—Concordo, e o café é muito bom... Olhe, eu sou a Bárbara.
—E eu o António. Prazer.
Ela finalmente desviou o olhar, e o António percebeu que afinal de contas ele não era o único envergonhado ali.
—Amanhã gostaria de se sentar ao pé de mim, António?
Ele corou até às pontas do cabelo.
—Sim.